quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

1 ano e meio de mariles

Amorzinho, de fato, gosto muito deste lugar, no qual posso te escrever
à vontade. Sinto mesmo que a dimensão do tempo se perde, como se, de
repente, passado, presente e futuro se fundissem, num momento que ainda
não aconteceu, aquele no qual você, pela primeira vez, lerá as coisas
que te escrevo agora.
O fato é que, ao longo dos últimos anos, cada vez mais escrevo sobre
as coisas boas e menos, sobre as más. Não é que a nossa vida seja
onírica. Porém, noto que a memória humana mais facilmente retem o que é
mau: as tragédias e decepções, têm um lugar especial em nossas
reminiscências. Certamente não faltarão oportunidades para que te conte de
nossas lágrimas em família, porém, sinto mesmo que, se não escrever
sobre as coisas boas, talvez as esqueça. Talvez a vida tire da
minha recordação o toque da sua pele, o cheiro do seu cabelo, os sons
inarticulados, porém extremamente expressivos de sua voz. É preciso
anotar! Anotar com presença e sabedoria, com detalhes e urgência, antes
que o sofrimento, comum a todos os mortais, tinja, com suas cores
vívidas, a tela da memória, empurrando para trás as pequenas maravilhas
de nosso lar.
Com efeito, não é preciso nenhuma vocação para ser infeliz. O exílio,
a desventura, a decepção e a solidão nos tocam a todos. Não
há aquele que não tenha desejado evadir-se de tudo, que não haja
sorvido, uma vez que fosse, a impressão de estar sozinho no Universo.
Entretanto, para ser feliz, é questão de talento; de inteligência
emocional, de coragem e de resolução. .
Então, deixa que te conte essas coisas de ser feliz.

Você tem quase um ano e sete meses agora. É pequena e ativa. Não
fala muito, mas faz muitos barulhinhos lindos! Com as mãos, mostra tudo
o que quer, apontando para os outros e tocando, para mim.
Seu melhor amigo e brinquedo, certamente é o travesseiro, Leva-o
aonde for, e não cansa de mexer nele. É com ele que mais brinca de se
esconder, e é uma visão comum, a de você arrastando seu travesseirinho
pela casa. Já desistimos de pôr-lhe fronha ou te convencer de que o
berço é seu lugar. Você adora estar com ele e nós apenas te
respeitamos.
Também é extremamente arteira. Tem cara de boazinha e, em geral, é
quase uma santa. Pouco exige para si mesma, estando, porém, sempre
disposta a sorrir e acarinhar alguém. Entretanto, isso não a exime da
realidade de ser a criança mais arteira que todos ao seu redor
conhecem.
Não só a constância, mas a consistência de suas artes é notável.
Creio que terá muita criatividade, porque, francamente, é o que
demonstra, nas suas travessuras. ,
Outro dia, atirou os sapatos e as roupas no lixo. Hoje, molhou
bolacha de maisena no balde de desinfetante - ainda bem que foi
percebida logo - e comeu cocô de passarinho. Tudo isso nos minutinhos em
que não tem alguém te vigiando.
Então te digo que, apesar de tudo, são tempos felizes. Tempos de
Mariles. Tempos de você crescendo em "graça e beleza" perto de nós.
Tempo da tua vida se desenrolando em nossas vidas, e disso ser o pano de
fundo para tudo o mais, inclusive, para as adversidades.